NESTA vida, em que sou meu
sono, Não sou meu dono, Quem sou é quem me ignoro e vive Através desta névoa que sou eu Todas as vidas que eu outrora tive, Numa só vida. Mar sou; baixo marulho ao alto rujo, Mas minha cor vem do meu alto céu, E só me encontro quando de mim fujo. Quem quando eu era infante me guiava Senão a vera alma que em mim estava? Atada pelos braços corporais, Não podia ser mais. Mas, certo, um gesto, olhar ou esquecimento Também, aos olhos de quem bem olhasse A Presença Real sob disfarce Da minha alma presente sem intento. |
sexta-feira, 2 de dezembro de 2011
terça-feira, 20 de outubro de 2009
a la insolente muerte
EL PUENTE
Para cruzalo o para no cruzarlo
ahí está el puente
en la otra orilla alguien me espera
con un durazno y un país
traigo conmigo ofrendas desusadas
entre ellas un paraguas de ombligo de madera
un libro con los pánicos en blanco
y una guitarra que no sé abrazar
vengo con las mejillas del insomnio
los pañuelos del mar y de las paces
Ias tímidas pancartas del dolor
las liturgias del beso y de la sombra
nunca he traído tantas cosas
nunca he venido con tan poco
ahí esta el puente
para cruzarlo o para no cruzarlo
yolIo voy a cruzar
sin prevenciones
en la otra orilla alguien me espera
con un durazno y un país
(De Preguntas al azar – 1984-1985)
SOY MI HUESPED
Soy mi huésped nocturno
en dosis mínimas
y uso la noche
para despojarme
de la modestia
y otras vanidades
aspiro a ser tratado
sin los prejuicios
de la bienvenida
y con las cortesías
del silencio
no colecciono padeceres
ni los sarcasmos
que hacen mella
soy tan solo
mi huésped
y traigo una paloma
que no es prenda de paz
sino paloma
como huésped
estrictamente mío
en la pizarra de la noche
trazo una línea
blanca
(De La Vida ese Parentesis)
POR QUE CANTAMOS
Si cada hora viene con su muerte
si el tiempo es una cueva de ladrones
los aires ya no son los buenos aires
la vida es nada más que un blanco móvil
usted preguntará por qué cantamos
si nuestros bravos quedan sin abrazo
la patria se nos muere de tristeza
y el corazón del hombre se hace añicos
antes aún que explote la vergüenza
usted preguntará por qué cantamos
si estamos lejos como un horizonte
si allá quedaron árbores y cielo
si cada noche es siempre alguna ausencia
y cada despertar un desencuentro
usted preguntará por qué cantamos
cantamos porque el río está sonando
y cuando suena el río / suena el río
cantamos porque el cruel no tiene nombre
y en cambio tiene nombre su destino
(De Retratos y Canciones)
EN PIE
Sigo en pie
por latido
por costumbre
por no abrir la ventana decisiva
y mirar de una vez a la insolente
muerte
esa mansa
dueña de la espera
sigo en pie
por pereza en los adioses
cierre y demolición
de la memória
no es un mérito
otros desafían
la claridad
el caos
o la tortura
seguir en pie
quiere decir coraje
o no tener
donde caerse
muerto
(De A Ras de Sueño, 1967)
Mario Bennedeti
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Canção de Amor da Jovem Louca
Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro
(Acho que te criei no interior da minha mente)
Entra a galope a arbitrária escuridão:
Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro.
Cantaste-me para a loucura; beijaste-me para a insanidade.
(Acho que te criei no interior de minha mente)
Retiram-se os serafins e os homens de Satã:
Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro.
Envelheço, porém, e esqueço-me do teu nome.
(Acho que te criei no interior de minha mente)
Sylvia Plath (tradução de Maria Luíza Nogueira)
domingo, 2 de agosto de 2009
Spleen
São tantas lembranças, que sinto ter mil anos.
Gavetas entupidas de notas e planos,
promissórias, poemas, cobranças, canções,
e mechas de cabelo entre intimações,
guardam menos segredos que o meu triste cérebro.
É uma pirâmide, um gigantesco féretro
mais pesado de mortos que a vala comum.
-- Sou cemitério sem lua, cafarnaum
onde rastejam vermes longos e gulosos
que devoram sempre meus mortos mais saudosos.
Sou um velho boudoir com mofados buquês,
roupas fora de moda sobre os somiês,
onde só as ninfas nos pastéis desbotados
aspiram o odor dos frascos destapados.
Não há nada mais longo que os trôpegos dias
debaixo do inverno das neves mais frias,
quando o tédio, fruto da morna indiferença,
ganha imortalidade e onipresença.
-- Agora não és mais, ó ser superior,
que um granito cercado de um vago pavor,
dormindo no fundo do deserto à socapa,
velha esfinge esquecida, perdida no mapa,
mas que não perde o brio e ainda faz farol,
cantando seus versos à luz do pôr-do-sol.
Charles Baudelaire Tradução-Jorge Pontual
segunda-feira, 25 de maio de 2009
SOY MI HUESPED
Soy mi huésped nocturno
en dosis mínimas
y uso la noche
para despojarme
de la modestia
y otras vanidades
aspiro a ser tratado
sin los prejuicios
de la bienvenida
y con las cortesías
del silencio
no colecciono padeceres
ni los sarcasmos
que hacen mella
soy tan solo
mi huésped
y traigo una paloma
que no es prenda de paz
sino paloma
como huésped
estrictamente mío
en la pizarra de la noche
trazo una línea
blanca
(De La Vida ese Parentesis)
domingo, 24 de maio de 2009
A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.
Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.
Se ao menos atingir neste lugar
Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar,
Na ausência, ao menos, saberei de mim,
E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.
Fernando Pessoa
MARIO BENEDETTI
(1920-2009)
haikais
si en el crepúsculo
el sol era memoria
ya no me acuerdo
las religiones
no salvan / son apenas
un contratiempo
lo peor del eco
es que dice las mismas
barbaridades
hay pocas cosas
tan ensordecedoras
como el silencio
durante el sueño
los amantes son fieles
como animales
pasan las nubes
y el cielo queda limpio
de toda culpa
las plantas oyen
si uno las lisonjea
se hinchan de verde
en todo idilio
una boca hay que besa
y otra es besada
Todos los 224 haikais de Mário Benedetti pueden ser leídos en su libro RINCÓN DE HAIKUS. Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 2000. 236 p. ISBN: 950-07-1835-9
segunda-feira, 20 de abril de 2009
[DE Bertolt Brecht]
1
É verdade, eu vivo em tempos negros.
Palavra inocente é tolice.
Uma testa sem rugas Indica insensibilidade.
Aquele que ri Apenas não recebeu ainda A terrível notícia.
Que tempos são esses, em que Falar de árvores é quase um crime
Pois implica silenciar sobre tantas barbaridades?
Aquele que atravessa a rua tranquilo
Não está mais ao alcance de seus amigos
Necessitados? Sim, ainda ganho meu sustento
Mas acreditem: é puro acaso.
Nada do que faço Me dá direito a comer a fartar
Por acaso fui poupado
(Se minha sorte acaba, estou perdido!)
As pessoas me dizem:
Coma e beba! Alegre-se porque tem!
Mas como posso beber e comer, se Tiro o que como ao que tem fome
E meu copo d'água falta ao que tem sede?
E no entanto eu como e bebo.
Eu bem gostaria de ser sábio
Nos velhos livros se encontra o que é sabedoria:
Manter-se afastado da luta do mundo e a vida breve Levar sem medo
E passar sem violência
Pagar o mal com o bem
Não satisfazer os desejos, mas esquecê-los Isto é sábio.
Nada disso sei fazer: É verdade, eu vivo em tempos negros.
2
À cidade cheguei em tempo de desordem
Quando reinava a fome. Entre os homens cheguei em tempo de tumulto E me revoltei junto com eles. Assim passou o tempo
Que sobre a terra me foi dado. A comida comi entre as batalhas Deitei-me para dormir entre os assassinos
Do amor cuidei displicente
E impaciente contemplei a natureza.
Assim passou o tempo Que sobre a terra me foi dado.
As ruas de meu tempo conduziam ao pântano.
A linguagem denunciou-me ao carrasco.
Eu pouco podia fazer. Mas os que estavam por cima
Estariam melhor sem mim, disso tive esperança.
Assim passou o tempo Que sobre a terra me foi dado.
As forças eram mínimas.
A meta Estava bem distante.
Era bem visível, embora para mim
Quase inatingível.
Assim passou o tempo
Que nesta terra me foi dado.
3
Vocês, que emergirão do dilúvio
Em que afundamos Pensem
Quando falarem de nossas fraquezas
Também nos tempos negros
De que escaparam.
Andávamos então, trocando de países como de sandálias
Através das lutas de classes, desesperados
Quando havia só injustiça e nenhuma revolta.
Entretanto sabemos:
Também o ódio a baixeza
Deforma as feições.
Também a ira pela injustiça
Torna a voz rouca.
Ah, e nós que queríamos preparar o chão para o amor
Não pudemos nós mesmos ser amigos.
Mas vocês, quando chegar o momento
Do homem ser parceiro do homem
Pensem em nós
Com simpatia.
domingo, 19 de abril de 2009
Sou um mestre na arte
De falar em silêncio
Toda a minha vida falei
Calando-me
e vivi em Mim mesmo tragédias inteiras
sem pronunciar
Uma palavra.
Fiódor Dostoiévski
quinta-feira, 2 de abril de 2009
Caimos todos nós
As folhas caem como se do alto
caíssem, murchas, dos jardins do céu;
caem com gestos de quem renuncia.
E a terra, só, na noite de cobalto,
cai de entre os astros na amplidão vazia.
Caimos todos nós. Cai esta mão.
Olha em redor: cair é a lei geral.
E a terna mão de Alguém colhe, afinal,
todas as coisas que caindo vão.
Rainer Maria Rilke
sexta-feira, 27 de março de 2009
Envelhecimento
Algum tempo atrás, talvez uns dias, eu era uma moça caminhando por um mundo de cores, com formas claras e tangíveis. Tudo era misterioso e havia algo oculto; adivinhar-lhe a natureza era um jogo para mim. Se você soubesse como é terrível obter o conhecimento de repente - como um relâmpago iluminado a Terra! Agora, vivo num planeta dolorido, transparente como gelo.É como se houvesse aprendido tudo de uma vez, numa questão de segundos. Minhas amigas e colegas tornaram-se mulheres lentamente. Eu envelheci em instantes e agora tudo está embotado e plano. Sei que não há nada escondido; se houvesse, eu veria.
Frida Kahlo
segunda-feira, 23 de março de 2009
E de repente é noite
Todos estão sós no coração da terra,
Atravessados por um raio de sol:
E de repente é noite
Salvatore Quasimodo
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
MIGUEL TORGA
"Devo à paisagem as poucas alegrias que tive no mundo. Os homens só me deram tristezas. Ou eu nunca os entendi, ou eles nunca se entenderam. (...) A terra, com os seus vestidos e as suas pregas, essa foi sempre generosa. (...) Vivo a natureza integrado nela, de tal modo que chego a sentir-me, em certas ocasiões, pedra, orvalho, flor ou nevoeiro. Nenhum outro espectáculo me dá semelhante plenitude e cria no meu espírito um sentido tão acabado do perfeito e do eterno."MIGUEL TORGA Diário II - 1943
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009
Sou lunar
Eu não penso, não me queixo,
nem discuto, nem durmo.
Não desejo nem sol, nem lua, nem mar, nem barco.
Não penso no calor que faz entre estas paredes,
nem como o jardim está verde;
e esse presente, que tanto desejei, já não o espero.
Não me anima nem a manhã,
nem o elétrico o seu tilintar alegre,
vivo sem ver o dia, esquecendo-me, do tempo,o ano e a hora.
Sobre uma corda estragada, eu danço – pobre dançarina.
Sou a sombra de uma sombra.
Sou lunar de duas sombrias luas.
Marina Tsvétaïeva -in E cantou como canta a tempestade
tradução: António Mega Ferreira -ed.Assírio e Alvim,2007
sábado, 21 de fevereiro de 2009
Todos estão sós
Todos estão sós no coração da terra,
Atravessados por um raio de sol:
E de repente é noite.
Salvatore Quasimodo
(trad. de Jorge de Sena – in Poesia do s.XX-Inova,Porto,1978)
segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
Insônia
Carlos de OliveiraDe vez em quando a insônia vibra com a nitidez dos sinos, dos cristais. E então, das duas uma: partem-se ou não se partem as cordas tensas da sua harpa insuportável.No segundo caso, o homem que não dorme pensa: «o melhor é voltar-me para o lado esquerdo e assim, deslocando todo o peso do sangue sobre a metade mais gasta do meu corpo, esmagar o coração».
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009
Meu lado Gris (3)
IMEMORIAL
Não fui quem sou, quando nasci.
Nem sou quem sou, quando amo.
Nem quando sofro.
Porque coexisto.
Porque a angústia
é uma herança.
Só me aproximo de mim mesmo
quando fujo,
atravesso a fronteira,
ou me defendo, ou fico triste.
Ou quando sinto a rosa
secreta e quente da vergonha
subir-me à face.
O mar me bate à porta,
como um grito da origem.
Mas como descobrir
a onda imemorial que me trouxe?
Cassiano Ricardo
in Um dia após o outro,1947
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
Meu lado Gris (2)
É estranho andar na neblina!
A vida é solidão.
Nenhum de nós conhece os outros,
Todos estamos sozinhos.
Hermman Hesse