Autor de 'Firmin', Sam Savage explica a gênese de seu best-seller
Juliana Krapp, JB Online
RIO - Tudo o que ele queria era poder amar a Ginger Rogers. E, por isso, sonhava em ser o próprio Fred Astaire: ter a cintura fina, as pernas compridas e um queixo que parecesse “o bico de uma bota”. Mas, quando se olhava no espelho, o que via era um camarada sem queixo, peludo e minúsculo: um rato. Literalmente.
Firmin é o protagonista-roedor que dá nome ao romance de estréia (Trad.: Bernardo Ajzenberg. Editora Planeta. 244 páginas, R$ 37,50) do americano Sam Savage, um sexagenário aposentado que ficou famoso de uma hora para outra com seu agora best-seller, recém-lançado no Brasil pela Planeta – sem o subtítulo original, Adventures of a metropolitan lowlife (algo como “aventuras de uma vida rasteira na metrópole”).
Firmin é um rato bibliófilo, eis o mote. Apesar de incapaz de falar ou de se comunicar, é ele o narrador do livro. Esqueça, no entanto, as singelas características que possuem os personagens-roedores em geral, o encanto redentor de suas habilidades humanóides: Firmin está muito longe dos contos de fada ou dos desenhos da Disney. Como ele mesmo afirma, prefere um bom papo com Dostoiévski ou Strindberg, “companheiros tão sofridos” quanto ele. E “histéricos” também. “Tenho desprezo pelo velho e bonzinho Ratty de O vento nos salgueiros”, resmunga nosso herói. E acrescenta: “Tenho vontade de mijar na boca do Mickey Mouse e do Stuart Little. Afáveis, sempre arrastando os pés, graciosos [o grifo é do autor], eles ficam encravados na minha garganta como espinha de peixe”.
Joyce no ninho
Firmin nasceu, pela força do acaso, no porão da Pembroke Books, livraria da Boston dos anos 60. Seu ninho foi feito sobre as folhas arrancadas de Finnegans wake, de James Joyce. Filho de uma rata alcoólatra, era o mais fraco na ninhada de 13 , que disputavam avidamente as 12 tetas da mãe. Assumiu-se, logo cedo, um freak: em vez de acompanhar a família na busca por comida, preferia devorar o acervo da livraria. Primeiro, no sentido literal. Depois, no literário: torna-se um ávido leitor, requintado e solitário. Ou seja: um baita sofredor, impossibilitado pelas suas limitações físicas de se expressar como gostaria. É, no fundo, um poeta – que não pode escrever sequer uma linha.
– Firmin é um ser humano em todos os aspectos, exceto no físico – explica Savage, em entrevista ao Idéias. – É um humano preso em um corpo de rato, e essa é a sua tragédia. Temos a história de um rato imaginando ser um homem, ou a história de um homem imaginando que é um rato? É claro que ele é as duas coisas.
Seja como for, a trajetória do próprio livro é surpreendente. Lançado há cerca de dois anos, pela pequena editora Coffee House Press, não ganhou quase nenhum espaço na imprensa. Seu autor, ainda inédito aos 65 anos, era completamente desconhecido no meio literário. O título foi alvo, como conta o próprio Savage, de uma única resenha, “pequena mas muito favorável” no Los Angeles Times. Apenas por acaso, o texto chamou a atenção de Elena Ramirez, manda-chuva da editora espanhola Seix Barral, que decidiu comprar os direitos da obra, inclusive para a língua inglesa. Não tardou para que o livro se tornasse um estouro na Espanha e na Itália, e reconhecido como um símbolo da paixão pela leitura. Agora está sendo traduzido para várias outras línguas, e em janeiro será relançado nos EUA pela Delta Books, uma divisão da Random House, editora gigante de Nova York. Firmin é, finalmente, amado.
– Estou surpreso e animado com as cartas que recebo de pessoas do mundo todo, tocadas com a história – conta Savage, assumindo-se ainda meio zonzo com tanto sucesso.
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Ibuiky - Terra de muitas cobras: Firmim - uma declaração de amor pela leitura
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