IMEMORIAL
Não fui quem sou, quando nasci.
Nem sou quem sou, quando amo.
Nem quando sofro.
Porque coexisto.
Porque a angústia
é uma herança.
Só me aproximo de mim mesmo
quando fujo,
atravesso a fronteira,
ou me defendo, ou fico triste.
Ou quando sinto a rosa
secreta e quente da vergonha
subir-me à face.
O mar me bate à porta,
como um grito da origem.
Mas como descobrir
a onda imemorial que me trouxe?
Cassiano Ricardo
in Um dia após o outro,1947
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